“Foram mesmo vinte minutos de caminhada, mas o terreno era íngreme, como se saíssemos do vale e alcançássemos uma espécie de platô, muito comprido e de vegetação rasteira, típica do cerrado, que se estendia até onde a noite permitia ver. Alguns aglomerados de terra foram surgindo na paisagem. Pareciam ogivas encravadas no chão, ou verrugas geológicas, largas como tocos de árvores centenárias, batendo na nossa cintura, ou um pouco mais altas. Logo estavam por toda parte.
[...]
Para além da varanda, no meio da noite, algumas luzes começaram a piscar. Pensei estar com mais sono do que imaginava ou que o vinho fazia meus olhos vacilarem. Mas as luzes foram se multiplicando e avançando no espaço, e Roberto também as viu. eram centenas de pontos iluminados, que vinham atravessando as copas das árvores e tomaram toda a frente da casa, desfilando na paisagem nostálgica que nos igualava. Eu me levantei e ajudei Roberto a fazer o mesmo. Debruçados no guarda-corpo, admiramos a migração em massa dos vagalumes. Foram minutos de espanto e delicada intensidade. Nem os morcegos se atreveram a atacá-los. Os insetos avançavam feito uma nuvem mágica, um corpo instável que se esgarça e se recompõe sem parar, soprado pela escuridão, em busca da Terra sem Mal.
[Trecho de Reserva natural, de Rodrigo Lacerda]
Broches Topografia interior
O texto de Rodrigo Lacerda que traz a ideia da natureza que esconde e revela o choque e a convivência de forças que encontram seu equilíbrio sempre em desafio. A medida que adentramos nesse terreno, nosso próprio interior se revela transcendendo nossas fronteiras e reservas numa comunhão com essa natureza tão negligenciada como fundante de cada um de nós.
Série de broches feita para o Desafio Tincal Lab Joalharia e Literatura 2022 em cobre com esmaltação.